Feito em casa
Cordisburgo é uma cidadezinha pequena, cravada nas montanhas de Minas. À primeira vista, pode parecer um município mineiro como tantos outros – com estação de trem, casinhas simples e muito verde – não fosse por um detalhe: Cordisburgo é o berço de Guimarães Rosa. E esse seu filho ilustre parece pairar em todos os cantinhos do município. A cidade do coração – é esse o significado de “cordis” + “burgo” – exala literatura por todos os poros.
Foi pra lá que fui, junto com minha família, num domingo desse outubro. O passeio era um desejo da minha avó, aniversariante por aqueles dias. E o roteiro: Gruta de Maquiné, um almoço demorado e visita à Casa de Guimarães Rosa, local onde o escritor morou, transformado em museu.
Saí de casa levando uma bolsa com água, dinheiro, frutas, protetor solar e um… gravador. Explico: esse negócio de tempo exíguo de produção faz a gente ficar esperto e evitar perder boas oportunidades. E, claro, boas oportunidades de falar sobre literatura não faltam em Cordisburgo.
Depois da gruta e do almoço (delicioso, por sinal!), era a hora da Casa do Guimarães. Eu já a conhecia, mas rever o local onde ele viveu, as fotos antigas do escritor e sentar novamente na varanda de Rosa para uma boa história é coisa que não tem preço. Quem narrou pra gente um trecho de Campo Geral, do livro Manuelzão e Miguilim, foi a pequena Monique Lopes. Ela faz parte do grupo de contadores de história Miguilim: jovens de Cordisburgo que apresentam a obra Roseana aos turistas que vão à cidade e levam as histórias para fora também. Antes de iniciar a prosa, Monique contou a origem do grupo, idealizado por Calina Guimarães, prima de Rosa.
No final da visita, corri atrás dela e pedi que indicasse aos ouvintes da Rádio Ufmg Educativa a visita ao Museu. Monique, muito decidida, aceitou sem titubear. Ensaiou um tempinho de nada e logo se pôs a falar com aquele jeitinho todo articulado que os Miguilim têm. A dica dela foi ao ar em nosso último programa.
Há cinco metros dali, meio embatucados com a minha permanência na Casa, estavam avó, tio, tia, primo, pai, mãe, irmãos, papagaio, cachorro… Todos esperavam, ansiosos, minha empreitada jornalística acabar. Senti que pus o pé no sorvete de todo o mundo. O tempo escureceu, Cordisburgo encheu-se de nuvens e a gente teve que ir embora às pressas. É, as famílias precisam de muita paciência com esses aspirantes a jornalistas…
Julia Marques
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Colocou o pé no sorvete dos familiares, mas acho que valeu a pena! rs. Eu já fui em Cordisburgo e me senti transportada também. Também percebi o orgulho que os moradores têm do seu cidadão mais ilustre, o Guimarães Rosa. Na minha visita, eu fiz uma espécie de “trilha” no meio do mato (mato é modo de falar, porque só tinha terra mesmo). Em cada parada, ouvíamos um trecho do conto Recado do Morro do mesmo grupo, o que fez com que parecesse que a história acontecia ali, ao vivo. Se eu fosse aspirante a jornalista naquela época, teria feito o mesmo que você!