O ritmo visual da pontuação
Quando as palavras são subtraídas, pontuações sinalizam diferentes estilos e ritmos literários

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É assim que começa, na língua inglesa (e com algumas palavras entre os sinais de pontuação, é claro), Moby Dick, romance de Herman Melville. Para quem está imerso na prosa, é fácil dar pouca atenção para essas pequenas marcações. Mas, muito além de separar sentenças e orações, pontos, travessões, exclamações, interrogações e parênteses ajudam a imprimir à narrativa um movimento próprio – entre um sinal e outro, a leitura flui de forma singular em cada obra.

Foi para explorar o compasso ditado pelos autores em obras literárias clássicas que Nicholas Rougeux criou Between the Words, série de cartazes que brinca com o ritmo visual dos sinais de pontuação. Para criar as peças, o artista procurou obras em domínio público disponíveis no Projeto Gutenberg. Nicholas eliminou letras, números, espaços e quebras de linhas dos textos integrais, deixando apenas a pontuação em uma linha contínua de símbolos, do jeitinho em que aparecem nas obras originais. O resultado foi usado para criar as espirais que aparecem nos posters – bom para colocar na parede e para observar os diferentes padrões presentes nas obras analisadas.
Em Ulysses, a predileção de James Joyce por parênteses fica aparente – já a famosa explosão verbal de Molly Bloom (com suas mais de 40 páginas e um único ponto) desaparece.
Em Mulherzinhas, clássico de Louisa May Alcott, são as vírgulas que saltam aos olhos.
Peter Pan e Orgulho e Preconceito
também foram reduzidos ao seu formato mínimo.
Foi depois de ver as criações de Nicholas Rougeux que Adam J Calhoun resolveu descobrir como ficariam seus livros favoritos se as palavras fossem subtraídas. Ele colocou lado a lado Meridiano de Sangue, de Cormac McCarthy, e Absalão, Absalão!
, de William Faulkner, e a diferença nas pontuações usadas deixa claro o contraste entre as prosas dos dois autores.

“Meridiano de Sangue tem frases curtas. Uma ou duas perguntas? Talvez, mas, em seguida, mais frases. E, no entanto, Absalão, Absalão! é selvagem; além disso, pode-se dizer, contém declarações, dentro de declarações, dentro de declarações: quem não ama isso?”, brinca Calhoun.
Aproveitando o ensejo, Adam fez também um levantamento do uso de cada sinal de pontuação nas duas obras e em Adeus às Armas, de Ernest Hemingway; Alice no País das Maravilhas
, de Lewis Carroll; Frankenstein
, de Mary Shelley; Grandes Esperanças
, de Charles Dickens; As Aventuras de Huckleberry Finn
, de Mark Twain; Orgulho e Preconceito
, de Jane Austen; e Ulysses
, de James Joyce:

Enquanto Cormac McCarthy marca suas frases prioritariamente com pontos finais, Lewis Carroll e Faulkner dão pouquíssima bola para as pausas máximas. Hemingway não liga tanto para vírgulas e disputa com os colegas o posto de mais questionador – Joyce e Twain estão logo atrás. E, levando em consideração o que encontra ao seguir o Coelho Branco, não é surpresa descobrir que Alice – e a temida Rainha “Cortem-lhe a cabeça!” de Copas – são fãs de uma boa exclamação.
Jessica Soares
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